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Inconstitucionalidade do Diferencial de Alíquota (DIFAL) de ICMS sobre Aquisições de Contribuintes Optantes pelo Simples Nacional - 30/09/2018

30/09/2018 - Direito Tributário
 
 
O governo brasileiro alterou a legislação sobre o ICMS, a fim de equilibrar a “guerra fiscal” entre os estados, através de edição de Emenda Constitucional.
 
Pela lógica definida pelo Congresso Nacional, se o destinatário de uma mercadoria é contribuinte do ICMS, caberá a ele recolher o imposto ao estado em que está sediado, aplicando uma alíquota interna. Ao seu turno, se o destinatário for consumidor final (contribuinte ou mesmo não contribuinte do imposto/pessoa física), caberá ao remetente da mercadoria recolher esse tributo, à sua respectiva unidade federada, recolhendo a alíquota interestadual.
 
O estado recebedor do imposto deverá repassar ao outro estado sua parte, de acordo com a distribuição estabelecida pelo senado nacional, sendo que a partir de 2009, 100% do ICMS devido nas operações interestaduais será devido ao estado de destino.
 
Mesmo assim, foi verificado que se a alíquota interestadual fosse menor do que a alíquota interna do estado de destino haveria prejuízo ao segundo por risco do consumidor adquirir a mercadoria em outro estado, razão pela qual se possibilitou cobrar, apenas no caso de destinação ao consumidor final, a diferença entre essas alíquotas (interestadual e interna) ao estado destinatário (diferencial), mesmo não sendo ele contribuinte do imposto.
 
Assim, a Emenda Constitucional 87, de 16 de abril de 2015, ao alterar o inciso VII, do §2º, do art. 155 da Constituição Federal, redefiniu, com vigência a partir de 2016, o Diferencial de Alíquotas do ICMS a Consumidor Final NÃO Contribuinte, estabelecendo o seguinte: “Nas operações e prestações que destinem bens e serviços a consumidor final, contribuinte ou não do imposto, localizado em outro Estado, adotar-se-á a alíquota interestadual e caberá ao Estado de localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado destinatário e a alíquota interestadual”.
 
A mesma Emenda, agora alterando o texto do inciso VIII, do mesmo dispositivo constitucional, considerando que o destinatário será sempre um consumidor final, redefiniu a responsabilidade pelo recolhimento do imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual, atribuindo-a da seguinte forma:
 
  1. ao destinatário, quando este for contribuinte do imposto;
  2. ao remetente, quando o destinatário não for contribuinte do imposto.
 
Pela regra constitucional, os contribuintes do ICMS devem recolher o valor desse imposto com relação à diferença entre a alíquota interna (isso significa o estado destinatário) e a alíquota interestadual, obrigatoriamente, SOMENTE nessas operações e prestações:
 
  • Quando entram num estado mercadorias destinadas ao consumo vindas de outra Unidade da Federação;
 
  • Quando entram em um estado mercadorias para o ativo imobilizado vindas de outras Unidades da Federação;
 
  • Quando entram em um estado prestações de serviço de transporte interestadual, que estão ligado a itens do uso e consumo, que tenham iniciado a prestação em outra Unidade da Federação; e
 
  • Quando entram no estado prestações de serviço que utilizam o transporte interestadual, que se relacionam com a aquisição de materiais para o ativo imobilizado e que tenham iniciado a prestação em outra Unidade da Federação.
 
Os procedimentos para a adoção da alíquota interestadual para não contribuintes do ICMS foram disciplinados pelo Convênio ICMS 93/2015, cuja cláusula nona está suspensa por força de decisão do Supremo Tribunal Federal (liminar ADI 5464).
 
Já para o contribuinte do imposto destinatário da mercadoria, em suma, pouco mudou: a) Se consumidor final, além de incidir a alíquota interestadual na operação, deverá recolher o diferencial, caso a alíquota interna de seu estado seja maior; e b) Se adquirir mercadoria para revenda ou industrialização, deverá recolher o ICMS aplicando a alíquota interna para seu estado, devendo o estado de origem cobrar a alíquota interestadual sobre a primeira operação de venda.
 
A grande celeuma acerca da aplicação do Diferencial de Alíquota passa a existir quando sua cobrança é estendida aos optantes do Simples Nacional, senão vejamos:
 
Em síntese, o Simples Nacional é uma expressão de fantasia comumente usada para se referir ao Regime Especial Unificado de Arrecadação de Tributos e Contribuições devidos pelas Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, instituído pela Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006.
 
Esse sistema simplificado de tributação nasce da celebração do princípio do tratamento favorecido para microempresas e empresas de pequeno porte (arts. 170, IX e 179 da Lei Fundamental), sendo também especificamente objeto de determinação constitucional a competência de lei complementar instituir um regime único de arrecadação dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, nos termos da alínea “d”, do inciso III c/c Parágrafo Único do art. 146.
 
A Lei Complementar nº 123/06, ao definir de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, especificamente para o ICMS, estabelece o seguinte:
 
Art. 13.  O Simples Nacional implica o recolhimento mensal, mediante documento único de arrecadação, dos seguintes impostos e contribuições:
(...)
VII - Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação - ICMS;
(...)
§ 1o  O recolhimento na forma deste artigo não exclui a incidência dos seguintes impostos ou contribuições, devidos na qualidade de contribuinte ou responsável, em relação aos quais será observada a legislação aplicável às demais pessoas jurídicas:
(...)
XIII - ICMS devido:
a) nas operações sujeitas ao regime de substituição tributária, tributação concentrada em uma única etapa (monofásica) e sujeitas ao regime de antecipação do recolhimento do imposto com encerramento de tributação, envolvendo (...); (Redação dada pele Lei Complementar nº 147, de 2014)
(...)
g) nas operações com bens ou mercadorias sujeitas ao regime de antecipação do recolhimento do imposto, nas aquisições em outros Estados e Distrito Federal:
1. com encerramento da tributação, observado o disposto no inciso IV do § 4º do art. 18 desta Lei Complementar;
2. sem encerramento da tributação, hipótese em que será cobrada a diferença entre a alíquota interna e a interestadual, sendo vedada a agregação de qualquer valor;
h) nas aquisições em outros Estados e no Distrito Federal de bens ou mercadorias, não sujeitas ao regime de antecipação do recolhimento do imposto, relativo à diferença entre a alíquota interna e a interestadual;
 
Assim, através do texto legal transcrito, a Lei Complementar 123/06 institui a obrigação do recolhimento do diferencial de alíquota do ICMS, nas aquisições, em outros Estados e Distrito Federal, sujeitas e não sujeitas a antecipação do ICMS.
 
Nas aquisições NÃO sujeitas a antecipação, prevista na alínea “h”, do §1º, do referido art. 13º, se impõe, por interpretação sistemática, a aplicação dos incisos VII e VIII, do §2º, do art. 155, da Constituição Federal de 1988. Portanto, corresponde a uma apuração normal de ICMS, incidente sobre operações onde o destinatário é consumidor final da mercadoria, contribuinte ou não do imposto, ou seja, não se aplica no caso do contribuinte que promover aquisição interestadual de mercadoria destinada a posterior saída tributada.
 
Nas aquisições sujeitas a antecipação, a Lei Complementar regulamentadora do Simples Nacional usa as expressões “com encerramento da tributação” e “sem encerramento da tributação”, a fim de diferenciar as operações em que o adquirente é consumidor final das que o adquirente vai comercializar a mercadoria adquirida.
 
Assim, a LC 128/08 estabeleceu a possibilidade de que, no caso de aquisição interestadual de mercadoria destinada a posterior saída tributada (ou seja, operação “sem encerramento da tributação”), a empresa submetida ao Simples Nacional venha a ser obrigada a realizar o recolhimento, a título de “antecipação”, de parcela do ICMS por ela devida. Essa parcela de imposto a ser antecipada deve ser calculada, de acordo com a referida lei, com base na “diferença entre a alíquota interna e a interestadual”.
 
A norma, nesse caso, atribui ao regime de diferencial de alíquota o papel de mero parâmetro para cálculo do ICMS antecipado, a fim de se diferenciar da apuração normal desse imposto e, com isso, afastar a restrição dos incisos VII e VIII, do §2º, do art. 155, da CF/88. Ao fazer isso, possibilita, apenas e tão somente nessa circunstância (antecipação), cobrar esse diferencial na aquisição de mercadoria por contribuinte, NÃO consumidor final, optante pelo Simples Nacional.
 
Como bem destacou o professor Guilherme Casulo Velho (A inconstitucionalidade frente ao Simples da nova exação de antecipação de ICMS/RS. Disponível em: < https://tributario.com.br/guicv/a-inconstitucionalidade-frente-ao-simples-da-nova-exacao-de-antecipacao-de-icmsrs/ >. Acesso em: 30.set.2018), “No que pese o parágrafo primeiro do artigo 13 da LC 123/08 ressalvar a possibilidade de incidência de ICMS nas operações sujeitas ao regime de antecipação, porém o mesmo faz uma importante ressalva para que seja deduzida essa parcela, sendo vedada a agregação de qualquer valor, ou seja, se for utilizado o instituto da antecipação então deve ser reservado o direito de posterior dedução do valor antecipado. (Grifado)
 
Ocorre que o valor antecipado não é abatido do valor devido no computo final da parcela do ICMS que compõe o valor dos tributos simplificados, ante a vedação do art. 23 da Lei Complementar 123/06. Isso inutilizou a ressalva existente no do art. 13, § 1º, XIII, g, 2, da Lei Complementar 123/2006.
 
Desse modo, sob ficção de mera “antecipação” do ICMS, o que de fato se estabeleceu foi a obrigação de recolhimento do diferencial de alíquota do imposto por contribuintes que não se enquadram na condição de consumidores finais das mercadorias adquiridas, o que viola frontalmente a Lei Maior (incisos VII e VIII, do §2º, do art. 155).
 
Violou, ainda, o princípio constitucional da igualdade, especificamente respaldado na garantia também constitucional de assegurar o tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, previsto pelos arts. 170, IX, e 179 da Carta Magna.
 
Efetivamente, o contribuinte de ICMS, ao revender a mercadoria adquirida em outro estado, conforme já explicado anteriormente, recolhe a alíquota interna do seu estado, incidente sobre o valor faturado na saída desse produto. Assim, além do estado destinatário não sofrer qualquer prejuízo quanto a uma suposta guerra fiscal, esse contribuinte efetivamente recolherá apenas o valor apurado na venda dessa mercadoria, creditando-se do ICMS incidente nas operações anteriores.
 
Já o contribuinte de ICMS optante pelo Simples Nacional, ao revender a mercadoria adquirida em outro estado, além de recolher a parcela do ICMS juntamente com os demais tributos, no computo do valor consolidado na tributação simplificada, irá também recolher o diferencial de alíquota. Assim, em comparação ao contribuinte tributado em operação normal, o optante do Simples será tratado de forma pior, já que além de recolher o valor incidente na operação interna, assumirá o valor do diferencial sem ter direito a dedução desse valor.
 
Como se isso não bastasse, há ainda outro aspecto que retira por completo a validade dessa sistemática de tributação:
 
A Carta Magna, nos termos do inciso III, do Parágrafo Único, do art. 146, condiciona a que a Lei Complementar, ao instituir o regime especial simplificado de tributação, garanta um recolhimento dos tributos unificado e centralizado (sem que haja qualquer autorização para que a lei complementar crie exceções a essa regra que impliquem tornar o contribuinte sujeito a outras incidências que não aquela unificada, expressamente prevista). Desse modo, conclui-se que a sistemática de diferencial de alíquota, por “antecipação” ou não do ICMS, prevista no artigo 13, parágrafo 1º, “g” e “h”, da LC 123/06 é flagrantemente inconstitucional.
 
A questão não está pacificada na jurisprudência dos tribunais pátrios, mas há decisão favorável nos autos da Suspensão de Segurança 4134/PA, da lavra do Ministro GILMAR MENDES, e o tema teve a sua repercussão geral reconhecida (RE 632.783/RO; relator ministro Joaquim Barbosa, Tribunal Pleno, julgado em 2/2/2012), o que dará ao STF a oportunidade de esclarecer, em definitivo, como deverão ser aplicadas e interpretadas as regras que asseguram tratamento tributário mais condizente às microempresas e empresas de pequeno porte.
 
 
 
 
 
Autor: Ricardo F. Mirante
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